__ Cândido Prunes*
Percorri quase 8.000 km nas (péssimas) estradas brasileiras, nas últimas 4 semanas. Saí de São Paulo e fui até o Maranhão, passando por quase todos os estados do Sudeste e Nordeste. Andei por estradas secundárias, muitas de terra, incluindo as do cerrado e da caatinga. Foi um longo trajeto fora da rota turística convencional, visando ter um conhecimento direto da realidade brasileira.
Pude observar dezenas (quase uma centena) de acampamentos do Movimento dos Sem Terra (MST) e de outras poucas agremiações congêneres. Alguns fatos chamam a atenção e só um observador que se dê ao trabalho de enfrentar o caos rodoviário brasileiro pode ter uma idéia do verdadeiro significado dos acampamentos do MST.
O primeiro aspecto a observar é que todos os acampamentos, sem nenhuma exceção, estão estrategicamente localizados junto a entroncamentos rodoviários importantes. Em segundo lugar, a proximidade com centros urbanos é também outro fator que as lideranças do MST levam em consideração na hora de escolher onde fincar a sua bandeira. Nas regiões brasileiras de pouca densidade populacional (interior do Maranhão, Piauí, Rio Grande do Norte, certas áreas de Minas Gerais) e em geral mais pobres, não observei a presença de nenhum acampamento. Como também nunca vi acampamento em estradas vicinais, nem em estradas de terra (interior de Minas Gerais, Bahia, Alagoas e Paraíba, especialmente). Aliás, o MST está praticamente ausente no Rio Grande do Norte, Ceará, Piauí e Maranhão – pelo menos nos trechos asfaltados que percorri entre Natal e São Luiz, de leste para oeste, e entre Fortaleza e Juazeiro (do norte para o sul), poucos foram os acampamentos observados. Alagoas e Pernambuco, em compensação, apresentam uma quantidade elevada de acampamentos em comparação com outros estados. Os acampamentos maiores e mais organizados também são aqueles melhor localizados.
Normalmente a população masculina de um acampamento não excede a 30% do total. O maior movimento é feito de fato por mulheres, que podem ser vistas cozinhando, colocando roupa para secar ou cuidando de crianças pequenas. Há vários acampamentos que aparentemente estão vazios (cerca de 20% do total). Nos acampamentos ocupados, um número significativo de barracos se encontra fechado. Em geral são os barracos melhor construídos e que apresentam lonas plásticas pretas para garantir que a chuva não molhe os seus ocupantes e/ou o seu conteúdo.
Esses são alguns fatos. A conclusão inicial que tiro do observado diretamente diz respeito à localização estratégica dos acampamentos. O MST está teoricamente em condições de paralisar todo o transporte rodoviário do Sudeste e Nordeste. Não há estrada (e entroncamento) importante onde não exista na proximidade um acampamento. Aliás, há mais acampamentos do MST do que postos da Polícia Rodoviária. Na hipótese de o MST ser um movimento revolucionário, como muitas vezes seus líderes têm declarado, ele ocupa uma situação única de poder rapidamente paralisar o País. Nem o Exército pode a ele se contrapor com tamanha eficiência. Mesmo que não existam armas nesses acampamentos, não é difícil, com uma ou duas centenas de pessoas, rapidamente bloquear uma rodovia. E o tumulto que se criaria num entroncamento bloqueado, com centenas ou milhares de ônibus, caminhões e automóveis parados, dificultaria qualquer ação armada por parte do Estado.
Talvez seja mera coincidência a localização desses acampamentos espalhados por todo o Brasil. Mas nenhum observador atento pode deixar de avaliar seu significado e eventual utilização, num contexto que fuja a mera questão agrária. Aliás, outros fatos observados também sugerem que o MST não está apenas empenhado na "luta" por terra. São muitas as coincidências que preocupam, pois elas criam todas as condições para o MST extrapolar e ameaçar ainda mais o precário Estado de direito brasileiro.
· Vice-Presidente do Instituto Liberal